O Marko já comentou, e muito bem diga-se de passagem, os vídeos no seu blog (link ao lado). Mas decidi também dar minha modesta opinião, contribuindo para o debate de idéias.
Sozinho - Dir.: André Pagnossim.
Um homem assiste televisão, disca um número de telefone e sai dirigindo pela noite. Ele aperta a campainha de um apartamento e é atendido por uma bela jovem que, intui-se, pode ser uma garota de programa. Segue um exercício em sensualidade com direito a um dos fetiches preferidos do diretor espanhol Bigas Luna, a podofilia (ou seja, atração sexual por pés). No entanto, repentinamente, quase sem nos darmos conta, o que era prazer transforma-se em terror, com sangue jorrando e membros decepados. Quando tudo parece terminado, surge um final surpresa para instaurar a dúvida, acabar com a certeza do espectador, provocá-lo. Perturbador!
Em seguida foram exibidos três vídeos de André Kapel:
Don't Smoke, 06 Tiros 60 ml e Hotel
Os curtas do Kapel enveredam para o gore. Lembra bastante os filmes de zumbis do George Romero e jogos de computador tipo Resident Evil. Dos três, o que eu mais gostei foi o primeiro, que faz uma divertida (e macabra) piada com o slogan do Ministério da Saúde sobre o perigo de fumar.
O que ficou claro nos curtas dos dois Andrés é que vai longe o tempo em que José Mojica Marins, nosso Zé do Caixão, tinha que colocar purpurina na película para realçar a aparição de um morto-vivo. Efeitos especiais, maquiagem, tiroteios, sangue cenográfico, cenas com dublês não ficam nada a dever às grandes produções americanas e européias do gênero terror. Do mais alto profissionalismo!
Terminando, foram exibidos quatro curtas do Eduardo Aguilar. Dois deles eu já conhecia, Lourdes e Jogos, esse visto numa minúscula tela no computador. Vamos à eles:
Jogos - Agora visto da forma correta, percebi coisas que tinham me escapado antes. A homenagem à Walter Hugo Khouri é evidente, não só por mostrar o concreto da cidade e o rapaz se chamar Marcelo, mas por inverter uma situação típica de alguns filmes do grande diretor.
Claustro - Aqui repete-se o triângulo, só que agora são dois irmãos e uma meia-irmã, sendo que um dos rapazes sofre de paralisia cerebral. Num certo momento a garota iniciará um jogo erótico com esse rapaz, para desgosto do outro. Este me lembrou de uma obra-prima do Carlão Reichenbach, Anjos do Arrabalde. A cena em que Betty Faria abraça o irmão problemático é recriada aqui. Por um instante cheguei a recordar também um filme que vi há muito tempo na TV, Um Dia na Morte de Joe Egg, mas ai pensei que estava viajando demais e voltei minha atenção para a tela. Qual não foi minha surpresa ao aparecer nos créditos finais um agradecimento ao diretor Peter Medak! Será coincidência???
O Quadro - Numa casa abandonada, um casal que se separa relembra os momentos bons e ruins da relação, as sensações de alegria e de tristeza, as palavras ditas e as que ficaram por dizer, o sentimento provocado por um quadro que não nos é permitido ver. A casa funciona como uma cápsula do tempo, da memória, dos sentidos. Como num filme de Alain Resnais.
Lourdes, um conto gótico de terror - Num convento, a chegada de um padre irá provocar pensamentos proibidos em duas noviças e na madre superiora. Desejos reprimidos, o profano e o sagrado, a ascese e a queda, num clima de sensualidade, mistério e estranhamento. Bela fotografia em preto e branco, onde algumas cores surgem em momentos chaves. Dedicado a Lucio Fulci, Pupi Avati e Khouri.
Bom, eu falei das influências, mas teria algo em comum entre eles, alguma coisa que identificasse um projeto autoral? Sim, vistos em conjunto eu pude perceber o que os une. Os 4 curtas passam-se em ambientes fechados (um quarto; uma sala/cozinha; o interior de uma casa; um convento). Dois dos títulos já deixam claro o aprisionamento em que se encontram os personagens. Temos uma sensação de claustrofobia. O Eduardo faz de nós, espectadores, testemunhas impotentes dos dramas, tensões, tristezas, medos e angústias daqueles seres humanos. Com eles nos preocupamos, nos solidarizamos, nos comovemos.
15 comentários:
Legal que isso de comparar os curtas do Kapel com videogame pra ele soa longe de uma ofensa, muito pelo contrário. Quando percebi que tinha coisa de Silent Hill (playstation) no 6 tiros, ele ficou super empolgado.
grato pelos comentários a respeito do Sozinho, e como te disse, Bigas Luna passa longe de ser influencia, apesar de ter gostado dos dois filmes dele que vi.
abraço
Sou apreciador dos curtas do Aguilar. O homem não para quieto e estou meio atrasado na obra dele. O último que vi dele foi LOURDES. Queria ver os outros...
E aí Sérgio, valeu pelo post, bem mais completo que o meu, legal isso de caçar influências, por mais que possa irritar o autor né, mas ajuda a situar a coisa. Nunca pensei em ver influência de game, mas tem a ver! É que eu parei de jogar lá pelos anos 1990, então perdi vários bondes... Abs!
Valeu Sérgio!! Vc. acertou muitas coisas, já havia me deixado impressionado qdo falou na sessão sobre "Anjos...", mas agora ao citar uma cena em específico, foi muito preciso, há tb. uma outra ponte com a Aninha (Vanessa Alves) q. espreitava o casal classe média baixa (Ênio e Irene) brigando. E cara, sobre Medak, precisão cirurgica!!!
André, a intenção era mesmo elogiar! Se os americanos podem adaptar videogames às dúzias, porque nós não poderíamos? Volto a dizer que fiquei surpreso ao ver o alto nível de qualidade na produção dos curtas. Vocês estão de parabéns!
Quanto ao Bigas Luna, acredito que não seja uma influência. Mas procure ver "A Teta e a Lua" e você entenderá o porque de eu tê-lo citado.
Fala, Ailton! Os curtas do Aguilar são excelentes! Quais você viu, além do Lourdes?
Olá, Marko! Os diretores podem se irritar mesmo, mas não são eles que dizem, quando o filme está pronto, que a obra não lhes pertence mais? hehehe. Faz muito tempo que não jogo, mas meu sobrinho é viciado em playstation, então eu tenho que estar antenado, entendeu?
E aí, Edú? Fico feliz em saber que tive alguns acertos hehe. Não lembro dessa cena da Aninha, preciso rever o filme, mas a cena da Betty com o irmão me marcou muito. E fico mais contente ainda ao saber que você viu e gosta do filme do Medak!!! Esse grande diretor também está precisando, como diz o Carlão, de uma retrospectiva, não é?
Abraços a todos!!!!
Os curtas do Aguilar que eu vi em ordem de preferência:
1. DIAS CINZENTOS
2. PUTA SOLIDÃO
3. LOURDES
4. OS ÚLTIMOS DIAS DE PAPAI NOEL
Pô, Ailton, legal saber q. seu preferido é "Dias Cinzentos" q. é uma espécie de "O Quadro" em outra vertente. Fique tranqüilo, não irá demorar muito prá vc. checar os demais.
Legal, Aguilar! Sei que vc é profeta dos bons!! hehehe
Ailton, viu como aqui tudo se resolve? hehe!!!
Minha ordem de preferência:
1 - Claustro
2 - O Quadro
3 - Lourdes
4 - Jogos
Eduardo, aproveitando o ensejo: você tem em fita os curtas que eu não vi?
Abraços!
Fala Sergio!!
Tenho sim, fique tranquilo, mais adiante rola um empréstimo, é q. agora estou imerso no novo projeto!!
Fala, Eduardo! Não tem pressa, não, mesmo porque também estou super-atarefado, e ainda tenho que ver os Fulci. Só pelo título, RITUAIS, seu novo projeto já me interessou! Abç!!
Dos que eu vi:
1 - O Quadro
2 - Claustro
3 - Jogos
4 - Lourdes
Oi, Marlonn! Continuo preferindo Claustro, se bem que O Quadro tem crescido bastante na minha lembrança. Abraço!
Cara, cheuguei agora de Curitiba e só pude conferir seu Blog agora. Primeiro, valeu pela presença na Mostra, depois valeu pelos comentários e elogios a todos.
Quanto a mim, o ZP está certo, apesar de nunca ter jogado Silent Hill antes (fui verificar o jogo depois que todos o compararam com o 06tiros) a narrativa de jogos sempre foi grande influência para mim (um dia ainda faço Splatter House :)).
Valeu mesmo pela presença e pelo incentivo ao sangue em geral.
E aguarda ai que o André ZP e o Aguilar tão chegando com novos.
Fala, Kapel! Fico muito honrado por ter os "comments" dos três diretores aqui! Gostei de saber que eu não estava tão errado ao ver influência de jogos de computador em seu trabalho (e que o ZP..hehe...já havia confirmado). Já estava sabendo do novo trabalho do Aguilar. O do André ZP estou sabendo agora. Pelo que foi visto na Mostra, vem coisa boa por ai! Mas e você, algum projeto em andamento? Espero que sim. Grande abraço!!!
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