"Trabalhando sob
encomenda, com um orçamento reduzidíssimo, Carlos Reichenbach conseguiu
realizar um filme autoral dentro do esquema de produção comercial da Boca do
Lixo e ter seu maior sucesso de público, com quatro milhões de espectadores.
A trama gira em
torno de Ana (Neide Ribeiro), uma assassina profissional disfarçada de
jornalista, que é contratada por um grupo de extrema direita para ir até a
“Ilha dos Prazeres Extremos”, local habitado por figuras estranhas e bandoleiros
e onde as pessoas vivem em total liberdade sexual, para matar um rebelde, um
escritor exilado e sua esposa e o guia que a irá acompanhar.
Esse é Sérgio
(Roberto Miranda), um ex-jornalista que morou um bom tempo na ilha, mas agora
vive no continente ao lado da namorada Lua (Teca). Ana elimina a desconfiada
Lua e segue com Sérgio até a fronteira, onde os dois são revistados. Nunca é
mencionado onde fica a tal ilha, mas pela música da trilha sonora imagina-se
que seja em algum lugar do Caribe (na realidade as filmagens aconteceram em Peruíbe,
Itanhaém e Iguape).
Chegando lá Ana descobre
que a ilha é um lugar como qualquer outro e que sua mística é divulgada apenas
para manter longe os intrusos. Mas ela tem que cumprir sua missão.
O rebelde Nilo (Fernando
Benini) é um cara meio maluco que vive recitando palavras de ordem de teor anarquista
e mora numa barraca na praia junto com suas companheiras Brigitte (Fátima
Porto) e Monique (Zilda Mayo). Eles aguardam a visita de um comerciante chamado
Luc Moullet (nome de um diretor da Nouvelle Vague que fez um filme intitulado
“Brigitte et Brigitte” e outro “Les Contrebandières”, com uma atriz chamada Monique!).
Já o escritor exilado William Solanas (Carlos Casan), autor de títulos como
“Prazer, Necessidade e Tabu” e “A Função do Prazer” mora numa bela casa em
frente à praia com sua insatisfeita esposa Lucia (Meire Vieira), que foi amante
de Sérgio no passado.
Tudo isso não
passou despercebido pela severa censura do regime militar, que exigiu cortes.
Porém, mais importante que a política e o sexo livre o que sobressai aqui são
as angústias, dúvidas, receios e contradições experimentadas pelos personagens.
Sérgio e Lucia, por exemplo, se amam, mas não conseguem reatar a relação porque
também amam William. É a sisuda Ana, porém, quem passará pelo conflito maior,
pois ficará dividida entre o prazer sexual alcançado com Nilo e a necessidade
de matá-lo. No final os dois estarão simbolicamente vestidos de forma quase idêntica,
de blusa amarela e calça jeans, correndo pela praia antes dela o esfaquear e
explodir seu corpo com dinamite.
Carlão misturou
suas influências cinematográficas (Rogério Sganzerla, Samuel Fuller, Jean-Luc
Godard, o cinema de sentimentos de Valério Zurlini) e literárias (Wilhelm
Reich, Oswald de Andrade, Mikhail Bakhunin), com meia dúzia de cenas de sexo
exigidas pelo produtor A. P. Galante para agradar seu público cativo, mas mesmo
essas cenas fogem ao convencional dos filmes da Boca, pois foram dirigidas com
extrema delicadeza, algumas ao som de música clássica.
“A Ilha dos
Prazeres Proibidos” é um filme, como bem o definiu seu autor, amoral e
libertário, terminando de forma bastante ousada com dois homens e uma mulher se
abraçando e beijando enquanto a câmera gira ao redor deles.
Numa época tão
difícil para o cinema brasileiro como a atual, com tantas produções caras e
anódinas, faz muito bem podermos assistir um filme de produção barata, sem
verba governamental, sem astros globais (os atores são todos da Boca, e
excelentes), com uma equipe técnica reduzida (Carlão foi também fotógrafo e câmera),
mas explodindo de criatividade como esse."
Publicado originalmente na revista Zingu!, n° 36.
Publicado originalmente na revista Zingu!, n° 36.
Um comentário:
Xokanti..! _Î_..!!
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